Unifesp/EPM

Edições
Anteriores

Informações


Boletim CEBRID
Número 51 Janeiro, Fevereiro, Março 2004

Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas

LEGISLAÇÃO

2. Opinião do CEBRID sobre a atual Classificação da Maconha na Convenção Única de Narcóticos da ONU_1961

A maconha (e seus derivados) está classificada na Convenção Única de arcóticos da ONU_1961 em duas listas de substâncias. Inicialmente ela figura na Lista I _ juntamente com morfina, heroína, fentanil, coca, cocaína, etc. Estas substâncias são consideradas fortes indutoras de dependência, estando a produção, os estoques, as prescrições, etc. severamente controlados e seu uso reservado exclusivamente em medicina.

Mas a maconha está também classificada na Lista IV da mesma Convenção de 1961, juntamente com a heroína, por ser considerada, na época, "particularly dangerous drug" e como tal sendo proibida a sua produção, manufatura, etc., não sendo reconhecido nem o seu uso médico.

É interessante saber como tal estado de coisas aconteceu no passado. Na realidade cabe razoável parcela da responsabilidade (e diríamos culpa) ao representante brasileiro na II Conferência Internacional do Ópio realizada pela antiga Liga das Nações em Genebra, em 1925. Delegações de 41 países estavam presentes e preparadas para discutir apenas os aspectos do controle do ópio e da coca e cocaína. A maconha não fazia parte da agenda e, portanto, as Delegações não deveriam estar preparadas e instruídas sobre esta planta. Em um esplêndido artigo científico, recentemente publicado, R. Kendel (Cannabis condemned: the proscription of Indian hemp. Addiction 98: 143-151, 2003), examinando as atas daquela reunião, explica-nos que o delegado egípcio solicitou a inclusão de maconha na agenda, por considerá-la "tão perigosa como o ópio". Houve natural resistência dos demais membros, sendo então que o delegado brasileiro disse ser a maconha no Brasil "mais perigosa que o ópio". Assim, após declarações por representantes de dois países onde o uso da maconha era comum, ela foi condenada naquela conferência.

Esta posição do delegado brasileiro foi plenamente reconhecida no Brasil: "No Congresso do Ópio, da Liga das Nações, Pernambuco Filho e Gotuzzo conseguiram a proibição da venda da maconha" (Lucena J.: Os fumadores da maconha em Pernambuco. Arquivos de Assistência a Psicopatas 4: 55-56, 1934).

Mas o mais curioso é que o representante brasileiro tinha no nosso país opinião diversa da defendida em Genebra.: "Ora, como acentuam Pernambuco Filho e Heitor Peres, entre outros, essa dependência de ordem física nunca se verifica nos indivíduos que se servem da maconha. Em centenas de observações clínicas, desde 1915, não há uma só referência de morte em pessoa submetida à privação do elemento intoxicante, no caso a resina canábica. No canabismo não se registra a tremenda e clássica crise de falta, acesso de privação ("sevrage"), tão bem descrita nos viciados pela morfina, pela heroína." (Ministério das Relações Exteriores _ Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes: Cânabis brasileira (pequenas anotações) _ Publicação no 1. Eds. Batista de Souza & Cia, 40 páginas, 1959).

E deve-se ainda acentuar que, no início do século XX, o ópio era muito pouco usado no Brasil, o que torna ainda mais frágil a afirmativa do representante brasileiro em Genebra.Esta decisão da II Conferência Internacional do Ópio refletiu-se mais tarde em um pronunciamento oficial do Governo Egípcio em 1944: "A Cannabis sativa é uma droga totalmente viciante, merecendo o ódio dos povos civilizados."

Com este histórico não é, portanto, de estranhar que, quando das discussões para preparar a Convenção Única de Narcóticos de 1961, a ONU aceitasse colocar a maconha também na mesma lista, a de no IV, reservada para as drogas extremamente perigosas e sem utilidade médica.
 


Principal

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA
Informações:
CEBRID - Última atualização:
 

Próximo