Disciplina de Neurologia Experimental

Correspondência: Cícero Galli Coimbra - Médico Neurologista e Professor Livre-Docente
Departamento de Neurologia e Neurocirurgia - Universidade Federal de São Paulo

Em defesa da administração de doses elevadas de riboflavina associada à eliminação
dos fatores desencadeantes no tratamento da doença de Parkinson do tipo esporádico
Sofrimento emocional e consumo excessivo de carne vermelha
como desencadeantes da doença de Parkinson

Cicero Galli Coimbra e Virgínia Berlanga Campos Junqueira

J) Considerações finais: implicações humanas, éticas, sociais e econômicas

Face às evidências e considerações expostas neste texto, estes signatários manifestam a sua estranheza ao verificarem que Ferraz, Quagliato e outros, mesmo sem o cuidado preliminar de uma mínima consulta à literatura referente à toxicidade da riboflavina, lançam de público suspeitas sobre pretensos riscos provocados pela correção da hipovitaminose B2 associada à doença de Parkinson do tipo esporádico [Coimbra e Junqueira, 2004], desestimulando explicitamente a correção dessa alteração metabólica - mediadora do processo degenerativo das células dopaminérgicas (como indicam os dados apresentados aqui e no estudo original), sem haverem eles mesmos testado os efeitos dessa nova abordagem terapêutica, ou sequer mensurado os níveis de FAD ou EGR-AC em pacientes portadores. Tal atitude mostra-se particularmente estranha ao ser acompanhada das inúmeras incorreções tipificadas neste texto como SITUAÇÕES "A" a "C". Evidentemente, a demonstração do Coeficiente de Ativação da Glutationa Redutase (EGR-AC) alterado nos pacientes portadores de doença de Parkinson do tipo esporádico (omitida por Ferraz, Quagliato e outros - caracterizando-se a SITUAÇÃO "A") inverte o ônus da prova, tornando obrigatória, sob o ponto de vista ético e técnico, a correção da deficiência em vitamina B2 ou a apresentação de dados em contrário por aqueles autores.

Ao mesmo tempo, observa-se a distribuição de um folheto no meio médico [Ferraz e Quagliato, 2004], destinado a promover a utilização de um medicamento xenobiótico patenteado, voltado para o mero alívio paliativo dos sintomas dessa doença (agonista dopaminérgico, portanto incapaz de sequer deter o avanço do processo neurodegenerativo), o qual é, não somente dispendioso, mas também dotado de efeitos colaterais conhecidos, declarados no próprio bulário desse medicamento, e largamente desconsiderados naquele folheto.

Registre-se que, na ausência de uma abordagem terapêutica voltada para o antagonismo dos fatores que favorecem, desencadeiam e/ou sustentam a neurodegeneração dopaminérgica, os pacientes portadores da doença de Parkinson do tipo esporádico evoluem para a morte após uma sobrevida média de 10 anos [Marttila e Rinne, 1991], ao longo dos quais assistem, a despeito do aumento gradativo do consumo de medicamentos sintomáticos, à progressão inexorável da própria invalidez - a qual pode ser acompanhada nas fases mais tardias pela desintegração das suas funções cognitivas, com o surgimento de demência em cerca de 22% dos casos [Poewe e Seppi, 2001] e de sintomas psicóticos como pesadelos vívidos, alucinações, delírios, sintomas maníacos, hipersexualidade, etc [Poewe e Seppi, 2001; Poewe, 2003; Schrag, 2004].  

Durante o período de sobrevida, nem mesmo o emprego do mais efetivo dos medicamentos sintomáticos - a levodopa - altera a expectativa vital, apesar da melhora da qualidade de vida proporcionada transitoriamente [Poewe e Wenning, 1998; Poewe, 1999]. Ao longo desse período de sobrevida média, as seqüelas resultantes da perda neural deverão acumular-se proporcionalmente ao tempo em que se sustentam fatores causais em atividade (tais como a deficiência de vitamina B2 secundária à baixa capacidade de absorção desse nutriente) [Coimbra e Junqueira, 2004], ocasionando, para os casos em estágio inicial, a perda da oportunidade de retornar ao estágio assintomático, dispensando o uso contínuo de medicamentos sintomáticos; para outros, determinando a impossibilidade de retomar ou sustentar uma vida economicamente produtiva, ou de recuperar a independência para o cuidado pessoal; para aqueles com a doença em estado mais avançado pode implicar na perda da própria vida, em decorrência de complicações clínicas associadas à imobilidade (tromboembolismo pulmonar, broncopneumonias, etc) [Poewe, 1999].

Assim, a discussão envolvendo a validade de um novo recurso terapêutico, potencialmente capaz de antagonizar os mecanismos fisiopatológicos mediadores da neurodegeneração dopaminérgica, tem profundas implicações humanas, éticas, sociais e econômicas. Se o novo recurso mostra-se capaz de fazer com que um importante percentual de pacientes, no estágio inicial da doença de Parkinson, retorne ao estágio zero (assintomático), mantendo-os assim indefinidamente, mesmo com a persistência de uma perda parcial da celularidade da substância negra (perda da reserva celular), seu emprego abrangente poderá reduzir largamente o número de novos casos de portadores sintomáticos da doença nos próximos anos, não somente diminuindo significativamente o número de consumidores de medicamentos paliativos dispendiosos ao longo da sobrevida média de 10 anos, mas também evitando-lhes profundos sofrimentos físicos, morais e emocionais, e mesmo a morte ao final dessa sobrevida.  O emprego da vitamina B2 em doses elevadas tem atualmente um custo mensal não superior a R$20,00 e a riboflavina, por constituir-se em um composto natural dos organismos humano e animal, não pode ser patenteada.

Para que se tenha uma idéia aproximada dos interesses economicos envolvidos, é suficiente assinalar-se que a doença de Parkinson ocasiona pesado dispêndio dos recursos de saúde, considerado muito elevado mesmo para o padrão de países economicamente abastados [Siderowf et al, 2000]. Os custos diretos provocados pela doença têm sido medidos em diversos países: em dólares americanos em meados da década de 1990 variavam entre $3.733,00 e $8.576,00 por paciente, atingindo $12.256,00 ao incluir-se os gastos com "homecare" [Dodel et al, 1998; Whetten-Goldstein et al, 1997; Rubenstein et al, 1997]. Os custos elevam-se com a progressão da doença e com o início e piora das flutuações motoras [Dodel et al, 1998; LePen et al, 1999].  Por exemplo, em 1995 os custos anuais diretos para pacientes com flutuações motoras eram estimados em US$4.260,00, comparados com US$1.960,00 para pacientes na ausência dessa complicação [Dodel et al, 1998]. Os custos não médicos, incluindo aqueles que incidem sobre o indivíduo e sobre a família, contribuem de forma significativa para a carga financeira total gerada pela doença, a qual encontrava-se estimada em US$25.000,00 em 1994 [Whetten-Goldstein et al, 1997]. A doença de Parkinson tem um grande impacto sobre a capacidade do paciente de sustentar o próprio emprego; em um estudo, 19 dentre 34 pacientes apresentando graus variáveis de severidade da doença já haviam parado de trabalhar ao início do estudo devido às limitações impostas pela doença, e apenas 6 permaneciam trabalhando ao final do estudo, 3 meses depois [Dodel et al, 1998].

Face ao largo interesse econômico evidentemente envolvido, por um lado, na sustentação de um público consumidor crônico de qualquer medicamento dispendioso e, por outro lado, no dispêndio de verbas públicas e privadas no tratamento de uma doença crônica degenerativa incapacitante, requer-se elevado senso de responsabilidade, honestidade científica, transparência e cautela (preferencialmente calcados em um envolvimento pessoal na obtenção de dados científicos específicos) na sustentação de qualquer posicionamento público.

O conflito de interesses relativos ao consumo de medicamentos dispendiosos produzidos para o tratamento de doenças crônicas como a doença de Parkinson, bem como a pressão sobre os médicos para que prescrevam os produtos do interesse da indústria farmacêutica que detém a patente desses fármacos, encontra-se adequadamente exposto no texto de Bronislaw Polakiewicz (FBT - FCF - USP), disponível "online" no endereço eletrônico mantido pela editora Mandruvá [Polakiewicz, 2002]:

http://www.hottopos.com/regeq9/bronislaw.htm

Estes signatários lamentam que a ABN, na pessoa de seu Presidente, tenha assumido frente a familiares e pacientes, de forma solidária com Ferraz, Quagliato e outros, a responsabilidade pela perda ou redução dos benefícios desse novo tratamento a tantos portadores da doença de Parkinson quantos deixarem de implementá-lo ou atrazarem a sua implementação (por decisão própria ou de seu médico), em decorrência do explícito e açodado desestímulo público à correção da hipovitaminose B2, emitido na ausência de qualquer estudo contrário ao estudo original, sem a cautela de sequer avaliarem por si mesmos os níveis plasmáticos de FAD ou EGR-AC em indivíduos afetados, e calcado nas SITUAÇÕES tipificadas como "A" a "C".

Adicionalmente, estes signatários reafirmam de público a qualidade técnica e a honestidade científica do seu estudo inicial sobre a pariticipação causal do estado alterado da vitamina B2 na doença de Parkinson do tipo esporádico, bem como a identificação do excesso de carne vermelha na dieta como fator desencadeante - o que encontra-se de acordo com os achados de diversos outros autores, ao contrário do que afirmaram Ferraz, Quagliato e outros, através de citações impróprias da literatura (SITUAÇÃO "C").  Graças a um número maior de colaboradores, uma casuística mais larga do que a inicialmente oferecida no estudo inicial de Coimbra e Junqueira [2004], não somente confirmatória, mas também contendo novas implicações e resultados, será apresentada no 16th International Congress on Parkinson's Disease and Related Disorders, que terá lugar de 5 a 9 de Junho de 2005, em Berlin, Alemanha - na organização do qual um destes signatários auxilia, propondo-se a divulgar e estimular a participação de médicos brasileiros no evento:

http://www.parkinson-berlin.de/pages/organization.htm

A data limite para a submissão de resumos através da rede mundial de computadores é 28 de fevereiro de 2005.

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