Procedimento Anestésico - Anestesia

O termo anestesia tem origem na palavra grega anaisthesis que literalmente quer dizer “sem sensação”. Anestesia foi listada no Bailey`s English Dictionary em 1721. Quando os efeitos do éter foram descobertos, Oliver Wendell Holmes sugeriu o nome anestesia pra o novo fenômeno, porém há controvérsias se ele inventou este termo ou se derivou da palavra grega que Platão empregou. Para Werr Mitchel,anestesia era a “morte da dor”. (41)

O ideal é que a escolha da anestesia seja realizada pelo paciente e pela equipe de saúde envolvida. Entre os fatores que influenciam na escolha da anestesia, estão: (41)

As vontades do paciente e compreensão dos tipos de anestesia que poderiam ser utilizados:

    - O estado fisiológico do paciente;
    - A presença e gravidade das patologias preexistentes;
    - O estado mental e psicológico do paciente;
    - A recuperação pós-anestésica de acordo com o tipo de anestesia;
    - As opções para o tratamento da dor pós-operatória;
    - O tipo e duração do procedimento cirúrgico;
    - A posição do paciente durante a cirurgia;
    - Os requisitos particulares do cirurgião.

As anestesias são classificadas em:

1. Anestesia geral

É um estado de inconsciência reversível, caracterizado por amnésia, analgesia, depressão dos reflexos, relaxamento muscular e homeostasia ou manipulação específica de funções e sistemas fisiológicos. (41)

Tem como objetivo a depressão irregular e reversível do sistema nervoso central, produzida por fármacos, que determinarão graus variados de bloqueio sensorial, motor, de reflexos e cognição.

Para que ocorra uma anestesia geral segura é necessária a permeabilidade eficaz das vias aéreas, sendo necessário a intubação traqueal.

A anestesia geral pode ser dividida em três fases:(41)

    - Fase de indução: compreende o período entre a administração de agentes anestésicos até o início do procedimento anestésico.
    - Fase da manutenção: corresponde ao período entre o início e o fim do procedimento cirúrgico.
    - Fase da emergência ou do despertar: corresponde a reversão da anestesia e termina quando o paciente está prestes a sair da sala de cirurgia.

Existem três tipos de anestesias geral: anestesia geral inalatória, anestesia geral intravenosa e anestesia geral balanceada. (9)

1.1. Anestesia Geral Inalatória.

Consiste na administração de anestésico inalatório como agente principal sendo o aparelho respiratório a via principal. Pode ser realizada por líquidos voláteis e gases.

A anestesia geral inalatória por líquidos voláteis é obtida quando vapores de anestésicos líquidos como halotano, tricloetileno, metoxiflurano e enflurano são inalados e absorvidos pela superfície alveolar. (34)

A anestesia geral inalatória por gases é obtida quando vapores de anestésicos gasosos como óxido nitroso, ciclopropano são inalados e absorvidos pela superfície alveolar combinada com oxigênio. (34)

1.2. Anestesia geral intravenosa ou endovenosa.

Consiste na administração de drogas através da injeção intravenosa. Estas drogas podem ser o tiopental, etomidato, cetamina, diazepínicos, propofol e o methoexital sódico. (34)

Tem como vantagem de não ser explosiva, ser agradável para o paciente caso a punção venosa não seja dolorosa, tem ação rápida, fácil de dosar e fácil de administrar. (34)

1.3. Anestesia geral balanceada

É aquela realizada pela combinação de agentes anestésicos inalatórios e intravenosos. (9)


2. Anestesia Loco-regional

Consiste na perda sensorial reversível em uma área ou região específica do corpo quando um anestésico local é injetado para bloquear ou anestesiar as fibras nervosas no sítio operatório e ao redor dele. As técnicas incluem: bloqueios espinais, epidurais, caudais, e os bloqueios dos principais nervos periféricos. (41)

A anestesia loco-regional são divididas em:

2.1. Local

Refere-se a administração de um agente anestésico para uma parte do corpo através da infiltração local ou aplicação tópica.

A anestesia local por infiltração consiste na injeção de uma solução que contém anestésico local nos tecidos através dos quais deve passar a incisão. Geralmente, é administrada combinada com epinefrina aumentando o tempo de duração da analgesia. Essa droga causa constrição dos vasos sanguíneos, impedindo a absorção rápida do anestésico prolongando sua ação local.(34)

Na anestesia local tópica, os anestésicos são administrados nas superfícies mucosas do nariz, boca, árvore traqueobrônquica, esôfago e trato geniturinário. Pode-se exemplificar, a anestesia da faringe para entubação traqueal.(34)

Entre as vantagens pode-se destacar: simples, econômica e não explosiva;o cuidado no pós-operatório é menor; não provoca os efeitos indesejáveis da anestesia geral; indicado para cirurgia de curta duração e superficial.

2.2. Anestesia Subaracnóideo ou Raqui

Também denominada de bloqueio subaracnóidea, anestesia raquidiana ou raquianestesia, consiste na realização da punção no espaço subaracnóideo que se localiza entre a membrana pia-máter e a aracnóide, onde contém o líquido cefalorraquidiano. O anestésico, após sua injeção no espaço subaracnóideo, é diluído pelo líquido cefalorraquidiano, diminuindo sua concentração antes de atingir os sítios efetores no sistema nervoso central.(22)

É capaz de produzir profunda e reproduzível analgesia sensorial com relaxamento muscular, facilitando o ato cirúrgico e atuando no período pós-operatório permitindo obter grandes efeitos com emprego de pequenas quantidades de anestésicos. (22,34)

Os anestésicos locais agem essencialmente sobre as raízes raquidianas e sobre as estruturas da superfície da medula espinhal promovendo interrupção temporária da condução nervosa quando se utilizam concentrações e doses efetivas. Estes anestésicos podem ser classificados de acordo com sua duração de ação em média e longa. A lidocaína tem duração de ação intermediária indicada para procedimentos com duração de até uma hora tendo como início em menos de cinco minutos. Ao adicionar a adrenalina a lidocaína, prolonga-se sua ação. A bupivacaína e a tetracaína têm duração de ação prolongada chegando a média até três horas de duração. (22,34)

A critério do anestesiologista, pode-se associar os anestésicos locais com os opióides, como a morfina, fentanil e sufentanil. A morfina é um opióide hidrofílico que tem início de ação lento durando de 60 a 90 minutos, duração prolongada de até 24 horas e risco de depressão respiratória tardia por dispersão rostral no líquido cefalorraquidiano. Já o fentanil e sufentanil são opióides lipofílicos com rápido início de ação de 3 a 5 minutos, duração variável de 3 a 9 horas e pequeno risco de depressão respiratória imediata, sem possibilidade de depressão respiratória tardia.

Deve ser realizada em condições de assepsia rigorosa sendo recomendado paramentação adequada de gorro, máscara cirúrgica e roupa exclusiva de centro cirúrgico, higienização das mãos, luvas estéreis e aplicação tópica de solução anti-séptica no local da punção, devendo-se remover o excesso para evitar meningite química líquido cefalorraquidiano. (22)

O material deve ser descartável e de uso único:

    - Bandeja contendo uma cuba para a solução anti-séptica;
    - Seringas descartáveis de 3 ou 5ml para a infiltração de planos com anestésicos e/ou para a injeção do anestésico;
    - Agulhas descartáveis, de fino calibre 25G, 27G;
    - Gaze estéril;
    - Campo fenestrado e pinça;
    - Anestésicos a critério do anestesiologista.

Durante o procedimento anestésico, o paciente pode ser posicionado sentado, em decúbito lateral ou ventral a critério do anestesiologista. Quando o paciente permanece na posição sentado, o anestésico é deslocado para o ponto mais baixo do saco lombar (22,34). Geralmente a punção lombar é realizada nos espaços L2 – L3; L3 - L4 ou L4 – L5. E o refluxo de líquido cefalorraquidiano pela agulha confirma seu correto posicionamento. (22)

As indicações desta anestesia estão relacionadas com as vantagens do seu uso como: facilidade de execução, bom bloqueio motor e relaxamento abdominal, latência curta, bloqueio da resposta ao estresse cirúrgico, diminuição da perda sanguínea intra-operatória, redução na incidência de eventos tromboembólicos pós-operatórios, diminuição na morbimortalidade de pacientes cirúrgicos de alto risco, extensão da analgesia no pós-operatório e terapia da dor aguda cirúrgica ou não.(22)

As contra-indicações são classificadas em absoluta e relativas. Porém, as relativas cabem ao anestesiologista analisar o risco-benefício de acordo com cada caso individualmente:

    - Absoluta: inclui a não aceitação do paciente.
    - Relativas: hipovolemia pelo risco de hipotensão arterial sistêmica; hipertensão intracraniana pelo risco de herniação cerebral após perda de líquido cefalorraquidiano pela agulha, ou pelo maior aumento da pressão intracraniana à injeção de grandes volumes de solução no espaço subaracnóideo; coagulopatia ou trombocitopenia, por maior risco de hematoma peridural; sepse pelo risco de meningite e infecção no sítio de punção, pelo risco de infecção no trajeto de punção e meningite.

Em relação as complicações, a anestesia raquidiana pode provocar respostas fisiológicas variadas, que, se não adequadamente controladas, podem resultar em problemas importantes, porém como avanço da técnica, novos fármacos e material adequado, as complicações tendem a ser menores. (22,45)

Entre as mais freqüentes pode-se destacar a hipotensão que pode ocorrer logo após o procedimento anestésico. Segundo a SOBECC (2003): "ela é causada pela vasodilatação desencadeada à medida que os nervos simpáticos, que controlam o tônus vasomotor, são bloqueados. Isso causa um acúmulo periférico sanguíneo que resulta em menor retorno venoso e menor débito cardíaco. A resposta hipotensiva fisiológica dada pelo organismo geralmente pode ser prevenida, hidratando-se anteriormente o paciente com a infusão de solução cristalóide. Uma droga como a efedrina pode ser administrada quando a medida a medida preventiva não for suficiente."

As lesões de estruturas osteoligamentares como a lombalgia, referidas no pós-operatório, estão muito mais associadas a posição cirúrgica do que ao procedimento anestésico.(22)

No pós-operatório imediato destaca-se a cefaléia pós-raqui que resulta da perda de líquido cefalorraquidiano através do orifício na dura-máter criado após a punção.

2.3. Anestesia Peridural ou Epidural

Consiste na administração de anestésico local no espaço peridural da coluna vertebral, podendo ser executado em nível cervical, torácico, lombar ou sacro podendo ser indicada tanto para anestesia cirúrgica quanto para analgesia.(22)

O espaço peridural se situa entre a dura-máter e o canal vertebral e a escolha do anestésico depende das características da cirurgia, como eficácia, latência e duração. Em relação a duração, pode-se escolher anestésico de curta duração, como a lidocaína ou de longa duração, como a bupivacaína ou ropivacaína. As mais utilizadas são a lidocaína a 2% sem ou com epinefrina a 1:200.000, a bupivacaína a 0,5% e a ropivacaína a 1%. A bupivacaína a 0,25% e a ropivacaína a 0,2% são usadas para analgesia pós-operatória, analgesia de parto ou tratamento de dor, e a bupivacaína a 0,75%, quando se deseja bloqueio motor mais intenso.(22)

Também se pode utilizar substâncias adjuvantes para prolongar a duração do bloqueio (epinefrina – 1:200.000) e melhorar sua qualidade com os opióides (fentanil – 50 a 100ug ou sufentanil – 10 a 20ug).(22)

A intensidade do bloqueio depende do fármaco utilizado, da concentração da solução empregada e do uso de adjuvantes, como opióides, clonidina e epinefrina. Portanto, a anestesia é de indução rápida e o paciente pode permanecer acordado se for conveniente.(22,34)

Para a realização do procedimento anestésico, é necessário um preparo clínico adequado compreendendo a história clínica, exame físico, avaliação do estado físico (ASA) e do risco cardiológico, além de conhecimento das condições hemodinâmicas do paciente, incluindo estado de hidratação, hematimetria, doenças cardíacas pré-existentes e fármacos em uso, condições pulmonares.

Cuidados antes de iniciar o procedimento anestésico:

    - Ter fonte de oxigênio disponível próximo ao paciente;
    - Aspirador;
    - Material para assistência ventilatória (máscara, bolsa com válvula unidirecional, laringoscópio e sonda traqueal);
    - Punção da veia periférica com cateter 16 ou 18;
    - Reposição hídrica com solução salina isotônica;
    - Medicações disponíveis: soluções de vasopressor (efedrina, pseudo-efedrina ou similar), tiopental sódico ou midazolan.

Após a administração da droga pode haver queda da pressão arterial devido a paralisia dos nervos vasomotores, podendo ocorrer náuseas, vômitos e dor durante a cirurgia. No pós-operatório pode ocorrer complicações, como cefaléia, paralisia ou meningite.(34)

Indicações:

    - Anestesia para procedimentos cirúrgicos nos membros inferiores, pelve e abdômen. Além, com menor freqüência, para cirurgia de mama;
    - Analgesia pós-operatória com ou sem opióide (morfina ou fentanil) em técnica contínua.

As contra-indicações são classificadas em absolutas e relativas:

    - Absolutas: não aceitação do paciente, infecção do local da punção, hipovolemia e choque circulatório, heparização plena com coagulograma alterado.
    - Relativas: deformidade da coluna vertebral, cirurgia prévia da coluna vertebral, infecção generalizada com bacteremia, hipertensão intracraniana, coagulopatias, doença neurológica medular.

Técnica do procedimento anestésico:

O procedimento deve respeitar os cuidados de manipulação do material estéril evitando a contaminação do mesmo e consequentemente do espaço peridural e líquor.

Deve ser realizado a anti-sepsia do local da punção com solução contendo anti-séptico retirando o excesso com álcool à 70% para complementação da degermação, cobrindo-o com campo fenestrado estéril.

O material deve ser descartável e de uso único:

    - Bandeja contendo uma cuba para a solução de anti-sepsia;
    - Seringa para o teste de perda de resistência;
    - Seringas descartáveis de 3 ou 5mL para a infiltração de planos com anestésicos e de 20 mL, para a injeção do anestésico;
    - Agulhas de Tuohy e de Weiss caracterizadas pela sua ponta arredondada com abertura lateral, devendo ser descartáveis;
    - Gaze estéril;
    - Campo fenestrado e pinça;
    - Anestésicos a critério do anestesiologista.

Em relação as complicações, podem ser classificadas de acordo com à técnica ou devido ao anestésico.

Durante a recuperação pós-anestésica, destaca-se a cefaléia pós-punção da dura-máter que se caracteriza devido à punção com agulha calibrosa ocorrendo hipotensão liquórica com cefaléia occipital intensa. O tratamento é o mesmo aplicado a cefaléia pós-raqui que consiste em repouso no leito, hidratação, analgésico e diazepam 10mg manhã e noite ou cafeína ou tiaprida. Caso persista a cefaléia após 24horas, orienta-se a realização do tampão sanguíneo autólogo. (22)

2.4. Bloqueios de nervos periféricos

Consiste na injeção de um anestésico local próximo a um plexo nervoso tendo como exemplo os bloqueios de plexo braquial, plexo cervical, plexo lombosacro e plexo femural. (44)

O início e a duração do bloqueio de nervos periféricos estão diretamente relacionados ao anestésico utilizado, sua concentração e volume, quase sempre associado a um vasoconstrictor.(44)

Esta anestesia é contra-indicada quando ocorre recusa do paciente ou sua falta de colaboração, infecção no local de injeção, alergia aos anestésicos locais e distúrbios de coagulação.(22)

As complicações estão relacionadas a injeção acidental intravascular ou de uma superdosagem de anestésico local, ocorre também porém, em menor escala, lesão do nervo por traumatismo ocasionado pela agulha ou por compressão pelo volume excessivo de anestésico.(44)

3. Analgesia/Sedação Consciente

Depressão da consciência induzida por medicamento durante a qual os pacientes respondem propositalmente aos comandos verbais quer isoladamente, quer acompanhados por estímulo tátil leve.